Eu não quero mais fingir
Eu não quero mais ter que engolir
Todas as coisas que quero dizer
Todas as músicas que quero cantar
Não quero usar salto alto
Ou qualquer coisa que eu ache desconfortável
Não quero mais tapar meus buracos
Com essas falsas esperanças que sempre me impõem
"É pro seu futuro"
"É pro seu amanhã"
Será que é tão difÃcil assim de entender
Que tudo que eu quero ao acordar de manhã
É um motivo simples e real de viver?
Eu não quero mais esconder
Tudo aquilo que sou
E nem ter que conviver com a culpa
Daquilo que algum dia fui
Eu quero apenas sorrir pro passado
Aguardar o incerto futuro
E abraçar com carinho o presente
Sem ter que me conter
Sem ter que entender
- Compreender
Eu quero ser mais de mim
E menos do que querem pra mim
Eu quero viver em paz
Não quero que ergam túmulos
Ou grandes lápides em meu nome
Muito menos que gritem minha perda
Se arrependam, ou chorem
Quero apodrecer em meio as hortênsias
Rosas, azaléias e outras flores
Servir de alimento ao solo febril
Derramar pela terra todo amor que ainda restou
Para que nada seja em vão
Não!
Não me venham com homenagens
Ou choros de lamentação
(muito menos me prendam nas paredes de um caixão)
Por entre as flores me deixem a dormir
Para que enfim eu descanse em paz
Dessa confusão de sentir e viver sem parar
No meio das flores quero estar
É isso que eu volto a pedir
Não me construam nada
Tudo que eu preciso está ali
No meio das flores
Quando eu morrer quero ser um jardim
lembro de quando te vi
naquela mesa no bar
– quanto encanto em ti!
(me) encontrei
faz tanto tempo
faz tantos versos
poesia
desenhada em cada linha
com letra cursiva e pincel
é, menino
agora eu te vejo aqui
tão perto
sentado comigo vendo a chuva cair
e eu que já não bebo mais
e eu que já não fumo mais
e eu que já nem sei mais de mim
sei de ti, menino
sei que de ti não quero sair
“Você faria sexo comigo?” Foi o que ela perguntou enquanto dividiam o décimo cigarro da noite. Ele riu, confuso. “Por que está me perguntando isso?”. Ela corou sem saber o que dizer.
Fazia frio, depois de tantos meses quentes, e a lua tinha se escondido em meio as nuvens negras. Eles pareciam duas crianças perdidas que não queriam ser encontradas. Falavam sobre os astros, traços, passos, e na intimidade de olhares se consumiam em afinidade. Dividiam um maço e uma garrafa de vinho barato sem qualquer preocupação.
“Eu faria sexo com você”, ele disse em resposta. Ela não sabia o que isso queria dizer. O encarou por um minuto e logo depois sorriu. Ele conhecia todos os seus segredos, e mesmo assim ambos fingiam não entender. “Acho que você está brincando com a minha cara.”
Ela sabia de poucas histórias, e escrevia tudo em contos na mente. Achava que ele já havia dormido com tantas, partido o coração de outras e amado apenas uma. Não era ela. Qualquer uma. Ela não precisava saber.
Ele tomou outro gole de vinho, acendeu o décimo primeiro cigarro da noite, olhou para ela e retribuiu: “E você, faria sexo comigo?”
“Mas é claro que não”.
Ele riu, encostou a cabeça no ombro dela, e assim ficaram até o último cigarro apagar.